Gostaria de registrar, antes de apresentar algumas considerações sobre o encontro com o livro acima citado, como as crianças reagiram com a presença das pedras do fundo de um rio coletadas por mim na Casa de Telhas, distrito de Jaboticatubas.
Juntei pedras redondas e chatas, grandes e pequenas. Disse que era uma lembrança de meu feriado (Semana Santa). Ao pegarem e baterem umas pedras nas outras, algumas crianças começaram a produzir sons que despertaram o interesse do grupo. Com isso, associaram as pedras a instrumentos de percussão. Um menino achou uma parecida com uma prancha(de surfe). Assim que foram perdendo o interesse pelas pedras, fui recolhendo-as e, depois de guardadas e acompanhando meu planejamento peguei, para iniciarmos nova conversa, o livro “BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS” de Nereide Schilaro Santa Rosa[1)
O livro apresenta muitas pinturas de períodos diversos que trazem brincadeiras e brinquedos. Além disso, há imagens de bonecas, carrinhos e outros brinquedos de povos e tempos diferentes.
A primeira pintura apresentada foi “Brincadeira de rapazes”, de Pieter Bruegel[2].
Brincadeira de rapazes, Pieter Bruegel, 118x161 cm, Kunsthistorisches Museum, Viena
Há um dia em que paramos de brincar. Um dia em que guardamos nossos brinquedos. Não que isso aconteça necessariamente de uma só vez, porém, mesmo assim abandonamos, de um jeito ou de outro, nossas mais belas aventuras e partimos para um mundo opaco.
Bachelard, por exemplo, fala que a infância deposita um tesouro de imagens e devaneios “em cada ser”, como um “jardim secreto”, guardado para mais tarde. Freud diz uma coisa parecida: ele fala que, quando a pessoa cresce e pára de brincar, ela apenas abre mão da conexão com os objetos reais, mas continua “construindo castelos no ar, sonhando de olhos abertos”. Ele chamava a imaginação de um parque de recreio — “um Parque Yellowstone”, preservado para nosso prazer futuro, quando não suportássemos a camisa-de-força da civilização.
Porém, nem sempre foi assim. Bruegel pintou uma aldeia medieval onde sua população provavelmente brincava com certa freqüência. Será que as pessoas tinham horas ou dias marcados para essa reunião? Enquanto muitos brincavam, outros trabalhavam ou envolviam-se com outras atividades ou esse momento era, de certa forma, obrigatório para todos? Essas perguntas aparecem quando olho para a imagem.
Voltando ao encontro com o livro e a turma de 4/5 anos, apresentei outras imagens e, assim que percebi o início do desinteresse do grupo, fechei o livro e deixei-os mais à vontade. As crianças, então, buscaram os brinquedos da sala. Espontaneamente, pequenos grupos formaram-se e uns escolheram panelinhas e outros o jogo de encaixe. Fui para a mesa começar este texto. Num certo momento, uma menina, M., mostrou o que havia feito com o jogo de encaixe: um robô.
“Robô”. Autora: M., 4 anos.
[1] ROSA, Nereide Schilaro Santa. BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS. Coleção Arte e Raízes.Editora Moderna, SP, 2001.
[2] Brincadeira de rapazes, Pieter Bruegel, 118x161 cm, Kunsthistorisches Museum, Viena.
[3] Para ler mais acesse: http://culturadobrincar.redezero.org/toy-story-3-ou-o-dia-em-que-deixamos-os-brinquedos/
(4) A Imaginação Infantil e as Histórias da TV Gilka Girardello. EM:http://www.construirnoticias.com.br/asp/materia.asp?id=830